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Índios Isolados ou em Fuga?

No último dia 23 de dezembro, uma vez mais, em meio à floresta Amazônica, um grupo de índios teve suas imagens roubadas do alto, por brancos em um grande pássaro de metal.

Quantos maus encontros, os velhos dirão, não começaram com alguns brancos chegando numa canoa, a  cavalo, trem ou avião? Quantos povos não foram exterminados a tiros ou dinamite, chuva de veneno ou cobertores com malária semeados por esses pássaros de metal?

Suas imagens roubadas rodaram o mundo. Serviram ao fetiche dos brancos (ao menos  os puristas) a imagem do exótico pode ser vendida, colocada a serviço da autopromoção de profissionais, empresas e instituições.

Ninguém está isolado. As imagens desses índios assustados nada falam dos tantos maus encontros com madeireiros, garimpeiros e missionários que fizeram com que escolhessem evitar ativamente esta civilização.

A noção de índio isolado é conveniente, desresponsabiliza, disfarça os aparatos de exploração e genocídio que obrigaram tantos povos à centenas de anos de fuga.

Porque participar da Luta e da Resistência Indígena

Vivemos num mundo onde – para além das miragens de bem-estar e satisfação – caminha a passos frenéticos e atrapalhados rumo ao colapso e à destruição. É importante, neste contexto, lembrarmos de onde viemos, que outras formas de existir não só são possíveis como reais. Só esta memória lembra pode no mínimo embaçar o vidro da tela desta ilusão civilizada e o olhar que ela nos impõe.

São em questões como território, água, vida, ser e deixar ser. que o confronto entre os interesses da máquina civilizada e luta pela existência dos povos livres se torna mais evidente.

A máquina civilizada quer devorar tudo, em seu anseio por lucro ela coisifica e produtifica a vida. Dominar recursos e transformar tudo em mercado, declara guerra não só contra os indígenas, mas contra os interesses da vida como um todo.

O único caminho – para que não sejamos esmagados, para que não nos tornemos escravos de corpo e alma a serviço dos interesses “desenvolvimentistas” da máquina – é que é preciso conhecer e fortalecer a resistência indígena.

Nós, deserdados de uma cultura outra – alheia a este projeto que nos empurra a loucura – juntamo-nos também a resistência que é a luta pela existência de modos-de-ser que a civilização tem se empenhado em não deixar ser.

Somos todxs indixs, ou melhor, unidos contra tudo aquilo que pretendem obrigar-nos a ser. Livres, e sem o peso de culpa, de sua domesticação e moral, com que pretendem nos roubar, ao nosso espirito, e a nossa vontade, a nossa conexão com a terra, a nossa mãe…tudo o que há de sagrado.

A luta indígena como exemplo contra o novo golpe

Como outros golpes, este golpe é uma grande reforma autoritária das leis. Como tantos outros, ele não ataca apenas os direitos indígenas, se impõe contra os interesses da maioria. E a maioria segue talvez distraída demais para se defender.

Índios manifestam na Esplanada dos Ministérios
Data: 11/11/2015 – Foto: Lucio Bernardo Junior / Câmara dos Deputados

Todos os partidos políticos, oposição e situação, parlamentares da direita e da esquerda, estão prostituídos, conspiraram a serviço de governos estrangeiros e multinacionais. O governo brasileiro, hoje como nunca, não passa de um fantoche dessas forças quase ocultas.

As metas deste golpe são destruir legalmente os direitos da maioria (e também das minorias indígenas) até submetê-las à situações de escravidão, como nas megafábricas chinesas, ou ao extermínio; legalizar a pilhagem de recursos e extensões de terra para grupos estrangeiros e multinacionais; garantir a continuidade dos grandes  privilégios de grupos políticos e empresariais.

Por valorizar e proteger seus territórios, por seus saberes ancestrais e práticas de autonomia, indígenas são contrários ao projeto golpista. Também são eles que oferecem à maioria, grandes exemplos de coragem na luta contra os golpes e tiranos: Sepé Tiarajú, Gerônimo, Búfalo Negro, Lucy Gonzales Parsons, Leonard Peltier, Emiliano Zapata, Tuíra Kaiapó e Marçal Tupã-i são só alguns dos indígenas lutadores a serem lembrados  como grandes exemplos de luta, não só por uma vida livre e digna, mas pela própria sobrevivência.

Nada veio fácil para nós! São 516 anos que sofremos golpes atrás de golpes

Por Potyra Tê Tupinambá

Nós povos indígenas estamos acostumados a lutar. Nada veio fácil para nós! São 516 anos que sofremos golpes atrás de golpes. Desde a invasão desse país começamos a ser apunhalados pelos usurpadores, os que querem massacrar e tomar a força o que não os pertence. Os netos, bisnetos e tataranetos dos que comandavam as invasões e golpes daqueles tempos estão aqui hoje, continuam a comandar os golpes! Começaram nos golpeando com o pretexto da fé e hoje os golpes são em favor do desenvolvimento.

Vendo a conjuntura brasileira me dá uma certa angústia, mas depois lembro dos meus antepassados que lutaram bravamente para que hoje eu pudesse bater no peito e dizer com orgulho que sou Tupinambá e me encho de forças para seguir lutando como eles fizeram. Precisamos fortalecer a nossa Cultura da Resistência, manter vivo em nós os valores dos nossos antepassados.

Acho que os brasileiros estão sentindo um pouco do que nós sentimos há séculos… invisíveis aos poderosos que só pensam em suas artimanhas para continuar no poder. O clamor do povo não foi ouvido assim como o nosso clamor não é.

Mas nós Povos Indígenas sempre lutamos pelo que acreditamos: nos pintamos, colocamos nossos mais belos adereços e partimos para a luta! Fechamos pistas, ocupamos espaços públicos, gritamos até sermos atendidos. O povo brasileiro precisa agora lutar! Nós lutaremos também!

Fonte: Índios Online

Quem lucra com as hidroelétricas que levarão morte ao rio Tapajós?

A Amazônia e seus habitantes estão constantemente ameaçados pela ganância desenvolvimentista do grande capital e seu funcionário, o governo brasileiro. Mais de 375 quilômetros quadrados de floresta estão para ser inundados para a construção de 32 hidroelétricas na bacia do rio Tapajós.

Mesmo antes da construção,o desmatamento na região irá alcançar índices sem precedentes. Após a inundação, a floresta morta submersa apodrecerá liberando enormes quantidades de metano na atmosfera intensificando ainda mais o efeito-estufa.

Terras indígenas como a Sawré Muybu já foram sufocadas sob o peso do lobby industrial: sua demarcação foi embargada. A construção dessas megaobras afetarão as vidas centenas de milhares, indígenas e ribeirinhos. Os Mundurukus perderão seu rio sagrado, as terras em que habitavam seus ancestrais. Muitos serão forçados a viver em conjuntos habitacionais, ou nas periferias das cidades. Em nome do lucro de uns poucos, a vida de muitos será sufocada. Mas quem é a minoria que manobra o estado para garantir seus lucros com tamanha desgraça?

Os políticos que afirmam que as hidroelétricas são para gerar energia para o povo, mentem descaradamente na defesa dos interesses de seus patrões. Os ganhos serão para corporações, indústrias de metais pesados, construtoras, megamineradoras e latifundiários. Seus portos, estradas, minas e parques industriais ocuparão o espaço que foi um dia a floresta.

Existirá alguma força que possa impedir essa enorme tragédia ambiental anunciada? Qual é a resposta que merecem esses ecocidas?

Identidades nacionais ferramentas de dominação

Em sociedades desiguais como as não-indígenas, identidades nacionais são antigas ferramentas de dominação na mão das elites locais sobre a maior parte da população. Através dessas identidades, uma minoria formada por políticos, fazendeiros e empresários (que são as elites) impõe seus interesses a uma população maior e diversa. Estas elites vêm por gerações concentrando poder e recursos, da relação de dominação das massas que controlam.

“Nacionalidades” estão relacionadas a práticas de saque e destruição que enriqueceram as elites européias coloniais. Esta é a origem pouco lembrada dos termos “argentino” e “brasileiro”.

“Argentino” vem da palavra “argentum” que significa “prata” em latim. Depois que europeus descobriram ouro e prata no continente sua ganancia se tornou avassaladora. Pilharam muitos povos, assassinaram e escravizavam outros para tomar o controle das minas e rios em que esses metais se encontravam.

Utilizaram os rios para levar em navios os metais para Europa. Um dos rios mais largos que melhor serviram aos saques espanhóis foi chamado de Rio del Plata, ou Mar del Plata. Davam os nomes aos lugares conforme aquilo que podiam pilhar, é aí que se encontra a triste origem da identidade “argentina”.

Os primeiros a serem chamados “brasileiros” foram indígenas que foram convencidos a derrubar grandes árvores daquela vasta floresta atlântica que existia na região nordeste do que hoje chamamos “Brasil”. Faziam isso em troca de miçangas, machados, espelhos e outras quinquilharias que os europeus traziam em seus navios. Levavam para seus países estas árvores de madeira avermelhada, da cor-de-brasa, que chamaram “pau-brasil”. “Brasileiros” era o nome dado a esses lenhadores, madereiros aliados dos portugueses, que derrubaram florestas que só existem em imagens de livros de história. Em troca dessa aliança estes povos foram levados a extinção.

Não foram poucos os nacionalistas, defensores das identidades nacionais, que ambicionaram a substituição das identidades indígenas por identidades nacionais. Por vezes essa substituição foi camuflada com discursos de apologia a mestiçagem para convencer indígenas e negros a colaborarem com políticas de branqueamento.

PEC 215: O genocídio legalizado

106420042012101554Desde os anos 2000 a Proposta de Emenda Constitucional 215 (PEC215) ameaça o futuro dos povos indígenas. No dia 28 de outubro esta lei criada para benefício dos ruralistas acaba de ser aprovada na Câmara dos Deputados, em Brasília. A PEC215 acaba com qualquer possibilidade futura de demarcação de terras para os povos indígenas, e ainda abre espaço para o revisão de ajuste constitucional implicando na perda de territórios já homologados.

Os processos de ampliação de areas também se tornam inviáveis. A aprovação da PEC215 é a mais clara evidência de como o estado de direito funciona em benefício das elites ruralistas. Para iludir os indígenas inventam direitos que seriam inalienáveis para, no momento conveniente, acabar com os direitos que propriamente não convém aos interesses dessas elites.

Essa política genocida se dá em paralelo com a exterminação das nossas grandes florestas, seja em benefícios de multinacionais, seja em benefício de grandes proprietários rurais que atuam em nome de seu próprio “progresso”. Chega de manipulação! Chega de discurso pacificador e tranquilizador, passividade e submissão é morte!

Somente autonomia, autodeterminação e autodefesa podem garantir a existência dos povos indígenas. Para a autonomia o único caminho é a luta!

 

“Com PEC 215 ou sem PEC 215 continuaremos a fazer as autodemarcações com apoio de nossos Aliados e, acima de tudo, de nossos Encantados e Ancestrais. Somos Abas Gwarinis Atãs (Guerreiros  Fortes)”. Casé Angatu, professor Tupinambá

Marchas e encontros contra a PEC 215

Estão acontecendo marchas e bloqueios de ruas e rodovias por todo o Brasil desde a aprovação da PEC 215 na Câmara. Pesquise na internet o local e data dos próximos eventos e participe das manifestações organizadas na sua região.

  • Cidades – Locais de concentração – Horários
  • Belo Horizonte – Praça Sete – 17hs
  • Brasília – Torre da TV – 10hs
  • Porto Alegre – Esquina Democrática – 14hs
  • São Paulo – Paulista (MASP) – 17hs
  • Recife – Praça do Derby – 16hs
  • Rio de Janeiro – Aldeia Maracanã – 16hs

Saberes ancestrais indígenas

O que nos ensinam os indígenas é antes de tudo, valores e relações. Vínculos com a Terra que, apesar de séculos de colonização, seguem vivos. A perspectiva ameríndia enxerga a potência na “diferença”, seus modos de ser mostram que é possível manter afinidades e conexões sem necessidade de sustentar uma mesma perspectiva. Os ameríndios nos lembram que somos capazes de nos fortalecer com a alteridade não-hierárquica aprendendo uns sobre os outros.jeroky ñemboe

Sobre assassinatos de docentes indígenas no Brasil

No último dia 8 de março o professor Carlos Alberto Domingos Kaxinawá, do povo Huni Kui foi morto a tijoladas em Santa Rosa do Purus, no Amazonas. Este não é um caso isolado. No Brasil, de norte a sul, o número de homicídios de docentes indígenas não pára de crescer.

Em 7 de novembro de 2014 o professor Davi Limeira de Oliveira, do povo Kaingang foi assassinado a tiros na cidade de Vicente Dutra, Rio Grande do Sul. Em  25 de agosto de 2014 o professor Roressi Madija Kulina foi assassinado a facadas em um campo de futebol na cidade de Juruá, no Acre. E estes são somente alguns dos assassinados ocorridos no último ano. Qualquer um que pesquisar assassinato de professores indígenas descobrirá que este também não é um fenômeno recente.

Assim como em outros países da América em que os povos originários lutam para garantir a continuidade de seus modos de vida, e a integridade de seus territórios, em terras brasileiras a matança de professores faz parte da estratégia antiindígena. São os professores aqueles que melhor compreendem os idiomas nacionais e os costumes das populações civilizadas. São eles capazes de entender também as armadilhas das políticas estatais e os códigos legais. Devido a esse conhecimento, entre muitos povos, são os professores que atuam politicamente como porta-voz de seus grupos, levando em conta também as palavras dos anciãos, no fronte de reivindicações dos direitos.

Os professores indígenas também têm a função de preparar as novas gerações para lidar com a ameaça que lhes impõem as nações civilizadas. Esta preparação é lenta e relacional, demanda tempo e diálogo entre os parentes. Quando um professor é morto as novas gerações (que geralmente também fazem parte de sua família) deixam de contar com o conhecimento e a experiência acumulados sobre os não índios. Ambos são fundamentais para lidar em diferença esferas com a intensão etnocida antiindígena.

Convenientemente ignoradas pelas autoridades e pelos agentes da mídia de massa, estas mortes são lembradas na historia oral, gerando entre os parentes uma ferida que não cicatriza. A certeza de impunidade, a farsa da justiça, tudo contribui para que a violência civilizada imputada sobre as populações indígenas passe desapercebida pela massa de cidadãos distraídos.

De nada adianta implorar por justiça ao estado democrático de “direitos”, quando este estado, através de sua morosidade e resignação, não cessa de colaborar com estas políticas antiindígenas de extermínio. Neste cenário de etnocídio mal disfarçado que é hoje a realidade indígena no Brasil, a autodefesa, reconhecidamente um direito originário, parece ser a única forma de garantir a sobrevivência das populações indígenas.

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Ser Libertário

Ser libertário é assumir a Liberdade como princípio de vida, cultivar relações simétricas de poder, não querer governar nem ser governado.

Ser libertário é ser habitualmente anárquico, e ativamente anarquista. É aprender com a história humana o quão nocivos todos tipos de autoritarismo e hierarquia por suas consequências.

Ser libertário é ser oponente a toda forma de corrupção estatal e de qualquer instituição que ameace a liberdade e a dignidade dos povos. Ser libertário é saber que seus inimigos sempre estão no poder, já que o poder político é sempre corruptor e corrompível.