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Quando a gente sai da aldeia, tem que saber lidar com a estupidez e a discriminação

“Quando a gente sai da aldeia pra estudar ou trabalhar, tem que saber lidar com a estupidez e a discriminação”, afirma a estudante do curso técnico de Enfermagem, Mirtes Sebastião.

Mirtes é uma bela jovem Tupinikuim, que estuda e trabalha em Vitória e cuida dos filhos em Caieiras Velha, Aracruz, norte do Estado. Conta que sempre estudou em escolas fora da aldeia e sempre foi boa aluna. Mas, ainda assim, a discriminação racial foi e continua sendo uma constante em sua vida.

“Mesmo sabendo me comunicar e com português muito correto, no momento em que eu abro a boca pra falar que sou de Caieiras, vêm os preconceitos”, reclama. Por conta dessa violência semvelada, Mirtes conta que já viu muitos colegas desistirem de estudar.

Principalmente os Guaranis, que, segundo ela, são mais tímidos e ainda mais discriminados, devido ao sotaque mais acentuado e à maior dificuldade de acompanhar o ritmo rápido da fala do branco. “Tive dois colegas Guarani que não conseguiam entender o que o professor explicava, ele falava muito rápido. Eu defendi muito os dois, mas não teve jeito, eles saíram da escola”, lamenta.

Já o Tupinikuim, conta, é mais expansivo. “Bate de frente”, afirma. O motivo é o maior esclarecimento das comunidades, que hoje conhecem melhor os seus direitos e sabem se defender. “Mexeu com um, mexeu com todos, é como tocar num vespeiro”, avisa.

Mas mesmo entre os seus, as desistências acontecem e muitos nem tentam sair da aldeia para estudar. “Eles sabem que vão ser achincalhados, debochados”, revolta-se. Mirtes é uma das defensoras da Escola Estadual Indígena de Ensino Médio Aldeia Caieiras Velha. Ela mesma fez a pré-matrícula e, diante da estagnação por parte do governo do Estado, se lançou a estudar na cidade, mas muitos dos que aguardavam a inauguração da escola não a acompanharam e interromperam os estudos.

Discriminação também no trabalho

Hoje, mesmo estudando o curso técnico e trabalhando “no maior hospital do Estado”, como ela gosta de enfatizar, afirma que ainda é discriminada. O preconceito não é escancarado, vem na forma de piadinhas, comentários, conta a jovem. “Porque eles sabem que é crime. Mas mesmo indiretamente, fica dentro da gente, machuca”, relata.

O cacique de Caieiras, Fabiano da Silva Lemos, também lembra de quando era discriminado, durante os doze anos em que trabalhou como carreteiro para a Aracruz Celulose (Fibria). Hoje, trabalhando na aldeia, acompanha o drama de seus parentes. Conseguir emprego nas fábricas é muito difícil, basta dizer que mora na aldeia e as portas se fecham.

Apesar de toda a dificuldade, Fabiano conta que suas memórias de infância são ainda mais tristes. “A gente apanhava na rua, em Coqueiral, se dizia que índio”, lamenta. Durante esta difícil semana para as comunidades indígenas, que realizaram protestos contra agressões sofridas em uma abordagem policial, Fabiano viveu o céu e o inferno. Ao mesmo tempo em que cartazes caluniavam seu povo, acusando-os de desordem e de impedir o progresso no município, ouviu, no mercado, pessoas dizendo que eles devem sim lutar por seus direitos e sua honra. “Elogiaram nossa luta”, compartilha, feliz.

Violência policial e conquistas

Uma semana depois do ato de truculência policial – que feriu seis indígenas e três cavalos na tarde do último sábado (4), próximo à Praia do Padres, em Aracruz – as comunidades liberam a última rodovia que ainda estava bloqueada em protesto: a Primo Bitti, que liga Coqueiral a Aracruz, passando por duas aldeias Tupinikim. Também chegaram a ser bloqueadas trechos da ES 010 e ES 257.

A liberação, no entanto, teve uma condicionante, aceita pelo prefeito Jones Cavaglieri (SD), que, em reunião com os caciques, também se desculpou e relatou sua retratação na rádio local. O prefeito se comprometeu a instalar sinalização e quebra-molas na rodovia, bem como construir um portal na entrada das aldeias. Na próxima segunda-feira (13) as comunidades decidirão sobre um futuro fechamento dessa estrada para fluxo de veículos de fora das aldeias.

A última foi desobstruída nesta sexta-feira (10), após reunião com um capitão, um major e um comandante da Polícia Militar de Aracruz. O cacique de Caieiras Velha, Fabiano da Silva Lema, relata que os três policiais se desculparam diante dos caciques e afirmaram que os agressores serão punidos assim que o quartel voltar a funcionar. As lideranças indígenas estipularam um prazo de 60 dias para o cumprimento da promessa.

Identidade cultural capixaba

O caso da agressão policial tem sido acompanhado pelo Ministério Público Federal (MPF), Fundação Nacional do Índio (Funai), Centro de Defesa dos Direitos Humanos (CDDH-Serra) e Conselho Estadual de Direitos Humanos, este se envolvendo diretamente em uma temática indígena desde há alguns anos.

“A gente entende a importância de proteger a cultura indígena e como isso é importante também para a identidade capixaba”, alega Morgana Boostel, presidenta do Conselho que, junto ao CDDH, tem buscado uma agenda na Corregedoria da Polícia Militar, para tratar da demissão dos quatro policiais autores da violência.

Apenas uma pauta ainda não avançou: o funcionamento da Escola Estadual Indígena de Ensino Médio Aldeia Caieiras Velha. Alvo de uma ação do MPF, a primeira audiência de conciliação está marcada para março e as tentativas de antecipação ainda não surtiram efeito.

A escola chegou a ser inaugurada no final de 2014, mas não funcionou, pois o governador Paulo Hartung não cumpriu a determinação de contratar os professores e outros funcionários. Resultado: prédio, móveis e equipamentos parados há dois anos, desperdício de dinheiro público – foram investidos cerca de R$ 372 mil pela prefeitura e gestão estadual anterior – e humilhação e abandono de estudo por parte dos jovens Tupinikim e Guarani.

 

Fonte: Século Diário

Tupinikins são agredidos e ameaçados de morte por policiais em Aracruz (Espírito Santo)

Índígenas da etnia Tupinikim, mulheres e crianças, foram violentamente abordados pela Polícia Militar no final da tarde desse sábado (4) na Rodovia ES-010, na altura da Praia dos Padres, em Aracruz, norte do Estado.

Quatro policiais se aproximaram aos gritos e com armas nas mãos, mandando que todos descessem dos cavalos em que estavam montados e deitassem no chão. A desculpa para agressão foi “obstrução indevida da via”.

Uma das lideranças tupinikim afirmou que naquele trecho não havia acostamento, por isso os cavalos ocuparam a pista.

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Os índios tentaram dialogar e acalmar os policiais, apelando para o bom senso. Os policiais por sua vez não foram truculentos com a armas em punho e atitude ameaçadora, não queriam diálogo.

Os policiais então atiraram contra os cavalos, ferindo gravemente três animais. Um dos cavalos teve que ser deixado na rodovia com hemorragia. Vários indígenas também foram feridos por tiros de bala de borracha e cassetetes.

Ao demandarem a presença da Polícia Federal os Tupinikim foram ainda mais insultados, pelos policiais. Um deles afirmou “Índio bom é índio morto”.

Por solicitação dos quatro policiais agressores, outros 40 policiais que participavam de uma greve foram até o local para reforçar o espancamento dos 20 indígenas.

Os Tupinikim bloquearam uma rodovia que atravessa suas terras desde o ocorrido de sábado, e a partir desta segunda (6) bloquearam também a rodovia ES-010 onde se deu o crime policial e a estrada que liga a cidade de Aracruz a fábrica da Fibria (antiga Aracruz Celulose).

Fonte: Século Diário

Indígenas exigem demissão de policiais autores das agressões em Aracruz

Duas rodovias bloqueadas, com passagem permitida apenas para ambulâncias e outras emergências, e reunião marcada para às 13h desta segunda-feira (6) com o Ministério Público Federal e a Fundação Nacional do Índio (Funai). Essas são as principais ações movidas pelas comunidades indígenas de Aracruz, norte do Estado, em protesto aos atos truculentos da Polícia Militar na tarde do último sábado (4), na presença de mulheres e crianças.

Logo após as agressões dos policiais, os Tupinikim fecharam a rodovia Primo Bitti, que liga as aldeias de Caieiras Velha e Irajá. E na manhã desta segunda-feira (6), também a ES-010 foi bloqueada, na altura da aldeia Três Palmeiras, a partir das 5h.

Ao contrário de algumas mensagens que têm sido compartilhadas nas redes sociais, os protestos são pacíficos e visam chamar atenção para o abuso de autoridade cometido pela Polícia Militar contra os indígenas.

Aegundo informou Josiane Francisco, liderança Tupinikim em Pau Brasil, a Comissão de Caciques se reunirá nesta tarde, na sede da Associação Indígena Tupiniquim e Guarani (AITG) em Caieiras, com o procurador da República em Linhares e o procurador da Funai. “A pauta principal é a demissão dos cinco policiais envolvidos diretamente nas agressões”, destaca Josiane.

O ressarcimento pelos cavalos feridos também é reivindicado. Além disso, outros assuntos pendentes com o governo estadual serão discutidos, entre eles, a abertura da Escola Estadual Indígena de Ensino Médio Aldeia Caieiras Velha. Mesmo inaugurada em dezembro de 2014, a unidade não chegou a funcionar, pois o então recém-empossado governador Paulo Hartung não cumpriu com a parte do Estado na parceria com a prefeitura e as comunidades, ao deixar de contratar os educadores e outros funcionários necessários.

Também nesta manhã os cavalos feridos por armas de fogo foram levados, a pedido da Secretaria de Saúde de Aracruz, para um rancho conveniado, no município da Serra, onde será feita a retirada dos projéteis e a perícia para integrar o processo que os indígenas estão movendo contra a Polícia.